Ervas, passeios e herbicidas
(Texto publicado no Diário de Coimbra de 6 de setembro de 2024)
Quando vejo uma zona tratada com herbicidas, é como um sinal vermelho para mim. Para ali não vou. Reconhecem-se por serem zonas localizadas de ervas mortas, quando tudo à volta é verde. Se a aplicação é muito recente e as ervas ainda não morreram, que é quando o perigo é maior, infelizmente é muito difícil reconhecer essas zonas.
Não vou para lá porque os herbicidas (que no Brasil são corretamente chamados agrotóxicos) são venenos e, mesmo quando muito especializados para eliminar um número pequeno de plantas, não deixam de ser venenos que, em maior ou menor grau, afetam negativamente também muitas outras plantas, animais e humanos. Por isso há tanta restrição ao uso de pesticidas que, em regra, só podem ser usados por quem tenha formação específica para a sua aplicação. Para melhor ilustrar o perigo dos herbicidas, e dos pesticidas em geral, basta lembrar tantos tristes casos de suicídio por ingestão dessas substâncias.
É particularmente importante manter as crianças bem afastadas das zonas tratadas por herbicidas, pois elas colocam as mãos em todo o lado e levam-nas à boca. Em alguns tipos de pesticidas nem é preciso isso – basta o contacto com a pele, ou a inalação. Os animais também devem manter-se bem afastados das zonas tratadas.
Por tudo isto não posso concordar com o uso de herbicidas para matar as plantas que nascem nos passeios das cidades. Compreendo que na agricultura sejam por vezes necessários, desde que aplicados com a máxima parcimónia e quando não houver outras alternativas ambientalmente melhores e economicamente viáveis, pois aí trata-se de garantir a segurança alimentar de todos nós. Embora, sempre que posso, eu opte por comprar produtos biológicos, nos quais tenho garantia de não terem sido usados herbicidas.
Mas envenenar as ruas por razões essencialmente estéticas, nos passeios onde passam os nossos filhos, netos e animais de estimação, é completamente despropositado. Nas culturas, depois da aplicação dos herbicidas, há períodos de segurança, muitas vezes de várias semanas, durante os quais não se pode mexer nas plantas e menos ainda consumir os produtos agrícolas, até os herbicidas aplicados perderem a maior parte da sua toxicidade. Como as ruas não são encerradas durante semanas à circulação de pessoas e animais depois da aplicação de herbicidas, pois impor tal restrição de circulação seria impensável, ainda mais incompreensível se torna que os herbicidas sejam usados nos passeios.
Para quem quer manter as ruas sem ervas, só resta cortá-las mecanicamente – com roçadoras, enxadas ou à mão. O problema é que as ervas voltam rapidamente a crescer, enquanto que, se forem aplicados herbicidas, não nascem novas ervas nos passeios durante muitas semanas, pelo que é muito mais caro o corte mecânico do que a aplicação de herbicidas, pois o corte tem de ser muito frequente, o que é incomportável para o orçamento das autarquias.
Sou de opinião que devem ser os próprios cidadãos a tomar a iniciativa de cortar as ervas que crescem à frente da sua casa. Se cada um tratar do passeio à sua frente, o trabalho é pouco e comportável, e até saudável. As ervas arrancadas podem ser colocadas em qualquer canto de um jardim ou bosque, que a mãe natureza rapidamente as composta e faz desaparecer.
Como em Portugal poucos tomam esta iniciativa, gostaria que a autarquia começasse por formalmente esclarecer esta matéria, explicitamente autorizando os cidadãos a cortar as ervas que crescem nos passeios. Naturalmente, apenas por meios mecânicos, sem uso de quaisquer herbicidas. Estou convicto de que muitos estariam dispostos a fazê-lo numa base regular, desta forma contribuindo para uma sociedade mais saudável, sem venenos nas ruas. E se deixarem sobreviver algumas ervas, muitas bem bonitas, será bom também.
Ficheiros
- Abrir ervas.pdf 3.0 MB