A guerra informativa é uma guerra a sério - parte II

(Texto publicado no Diário de Coimbra de 5 de abril de 2024)

Muitos países ditatoriais, com a Rússia em grande destaque, conduzem uma avassaladora guerra informativa contra os países democráticos, visando semear a mentira e a discórdia para mais facilmente concretizarem os seus objetivos imperiais. Lutar contra essa desinformação é uma função de soberania, em defesa do regime democrático, que tem de ser tão multifacetada como a guerra dos mísseis, das metralhadoras e dos drones. 

Em primeiro lugar, há que educar para que todos saibam reconhecer a desinformação. Nas escolas e em casa, a crianças, mas também junto dos jovens e dos adultos, é imperativo mostrar que temos de desconfiar do que se encontra nas redes sociais e na web. Por exemplo, temos de verificar a veracidade das informações através de várias fontes independentes. Esta tarefa educativa pode ser divertida; um bom exemplo é o projeto Get Bad News

Em segundo lugar é preciso desenvolver e manter repositórios de validação de factos (fact checking), que permitam esclarecer as dúvidas aos interessados. Há os nacionais, como o Polígrafo, a Prova dos Factos no Público e o Fact Check no Observador, mas são muito insuficientes. A União Europeia tem feito alguma coisa, como o EUvsDisinfo, mas também não chega. O Estado Português não faz quase nada. 

Em terceiro lugar, é preciso obrigar a identificar todos os vídeos, áudios e imagens gerados por Inteligência Artificial, particularmente os deep fakes que interferem com o processo democrático. Quem os produz ou distribui tem de ser obrigado a assinalar de forma totalmente visível que esses elementos não são reais, para não enganarem ninguém. Com penas pesadas para quem não cumprir. 

Em quarto lugar, é preciso ter uma presença contínua e efetiva nas redes sociais, pois não podemos esperar que sejam sempre os cidadãos a tomar a iniciativa de validar o que veem. Trata-se de levar o fact checking até aos sítios onde as falsidades são propagadas. Dada a dimensão das redes sociais, é preciso ter muita gente a fazer este trabalho, o que implica custos relevantes, mas não tem de ser apenas o Estado a fazê-lo - é uma tarefa que pode ser contratualizada com órgãos de comunicação social já existentes, com boas equipas de jornalistas.  

Em quinto lugar, é necessário identificar publicamente quem produz desinformação com frequência para que os cidadãos se possam afastar dessas fontes. As contas nas redes sociais com origem em agentes hostis devem mesmo ser eliminadas, em parceria com as empresas que gerem essas redes sociais. Portugal poderá não ter força suficiente para forçar as redes sociais a fazê-lo, mas a União Europeia tem essa capacidade. Não podemos tratar como cidadãos normais pessoas contratadas por países imperialistas como a Rússia para lançar falsidades, promovendo artificialmente forças extremistas. Quando identificadas, as contas dessas pessoas nas redes sociais devem ser eliminadas ou, pelo menos, assinaladas de forma visível. 

Em sexto lugar, deve ser criminalizado alguém ser pago por países hostis para lançar desinformação. Portugal tem sido relativamente poupado a esse fenómeno, mas noutros países isso tem vindo a ser cada detetado cada vez mais, e não devemos esperar pela casa ser roubada para colocar trancas na porta. Os agentes a mando de países hostis são muitas vezes cidadãos dos países atacados, pagos pelo país atacante. Quando identificados, devem ser condenados criminalmente. 

Outros mecanismos e ações podem ser definidos, mas se os que aqui enuncio forem efetivados, a situação em Portugal e na Europa melhorará muito. 

 

 
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