A tecnologia da guerra futura
(texto publicado no Diário de Coimbra de 2025/07/04)
A guerra que agora se trava na Ucrânia é muito diferente da que se travou no início da bárbara invasão russa em larga escala, em fevereiro de 2022. No início víamos grandes grupos de carros de combate, peças de artilharia, blindados. Agora, nas palavras de Vasyl Malyuk, diretor do Serviço de Segurança Interna da Ucrânia, cerca de 85% das baixas infligidas ao exército russo (material e soldados) são obra de drones. As perdas dos russos são brutais: cerca de 1 milhão de soldados, 11 mil tanques, 23 mil blindados, 29 mil peças de artilharia. Não admira que este tipo de material seja cada vez mais raro na frente de batalha.
Os soldados estão cada vez mais longe da frente de batalha. Os aviões lançam bombas planadoras a mais de 50 km do alvo, e raramente vão mais perto do que isso, com receio de serem abatidos. A frente de batalha atualmente é dominada por drones, que no início da guerra eram muito raros.
A aceleração da inovação é brutal. Na Ucrânia vemos ciclos de poucas semanas na introdução de inovações na linha de combate. Uma das poucas empresas portuguesas com sucesso no apoio aos ucranianos, a Tekever, que fabrica drones de vigilância, atualiza o seu software, e por vezes o seu hardware, a essa velocidade. Só assim consegue contornar as medidas que os russos tomam para impedir os drones de funcionar. Como soube construir uma relação direta com os ucranianos que estão na linha da frente, é informada mal os russos inventam novas técnicas para interferir com o funcionamento dos seus drones, e muda os drones para os tornar imunes a essas técnicas.
Portanto, ao definir como devemos investir na defesa de Portugal, não o podemos fazer para a guerra que agora se trava, pois daqui a um ano já será muito diferente. Temos de antever como a guerra vai decorrer daqui a uns anos. Portugal, com tantas empresas tecnológicas inovadoras, tem condições para ser um parceiro relevante na defesa da Europa.
Mas como será a guerra daqui a uns anos? Na inovação é muito arriscado fazer previsões, mas há algumas tendências que parecem seguras. A primeira é de que a dominância dos drones não vai desaparecer, mas sim acentuar-se.
Para nos defendermos de drones temos, em primeiro lugar, que conseguir detetá-los. Os drones pequenos, usados na linha de batalha, são particularmente difíceis de identificar. Há que usar sensores acústicos, térmicos, visuais, radioelétricos.
Depois de identificados, é necessário conseguir abatê-los, por exemplo interferindo com os seus sistemas de comunicação, de localização, de guiamento. Mas também com balas, usando metralhadoras que apontem automaticamente, pois os drones movem-se tão rápido que os humanos têm poucas hipóteses de lhes acertar sem ajuda.
Para drones que voem a maior altitude, fora do alcance das metralhadoras, são necessários drones anti-drone, que persigam e destruam os drones inimigos.
Uma evolução central vai no sentido dos drones autónomos (aéreos, terrestres e aquáticos), capazes de receber indicação de uma missão e executá-la sem necessidade de comunicar com qualquer operador, o que lhes dá uma enorme robustez.
Como os drones são muito baratos, comparados com outros equipamentos militares, uma evolução ainda mais decisiva são os enxames de drones, em que muitos drones independentes cooperam para atingir um alvo. Mesmo que o inimigo consiga abater muitos, a probabilidade de abater todos é baixa, atingindo-se assim quase sempre o alvo. A defesa contra estes enxames é um verdadeiro pesadelo.
Em todas estas áreas, e outras igualmente tecnológicas, as empresas portuguesas têm capacidade para ter produtos competitivos. Mas, sendo o mercado da defesa definido pelos estados, ao Estado Português pede-se que tome a liderança e defina linhas de desenvolvimento de capacidade nacional. Só se Portugal tiver capacidade própria é que será respeitado no contexto dos seus aliados e poderá ver os seus interesses tidos em conta.
Ficheiros
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