A União Soviética iniciou a segunda guerra mundial

(texto publicado no Diário de Coimbra de 2025-05-02)

(imagem da parada conjunta dos exércitos soviético e alemão em Brest-Litovsk a de 22 de setembro de 1939 - Bundesarchiv, Bild 101I-121-0011A-23 / CC-BY-SA 3.0, CC BY-SA 3.0 de, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=5475936)

A União Soviética, e agora a Rússia, comemoram a rendição da Alemanha nazi a 9 de maio com um grande desfile militar em Moscovo, pois foi nessa data em 1945 (hora de Moscovo, já que a assinatura foi a 8 de maio, hora da Europa Central) que foi assinada a declaração de rendição da Alemanha. A capitulação do Japão ocorreu mais tarde, a 2 de setembro de 1945.

O anúncio por Putin de 3 dias de trégua na guerra na Ucrânia, para coincidir com essa comemoração, veio trazer muita atenção para a data de 9 de maio, também porque muitos Chefes de Estado aliados da Rússia estarão presentes, visto se tratar do 80º aniversário do fim da segunda guerra mundial na Europa.

Mas é particularmente importante lembrar, no contexto atual, que a segunda guerra mundial se iniciou através de uma ação coordenada da Alemanha de Hitler e da União Soviética de Estaline; não foi uma ação unilateral de Hitler.

Com efeito, a 23 de agosto de 1939, a Alemanha e a União Soviética assinaram em Moscovo um "Tratado de não-agressão", que ficou conhecido pelo nome dos dois ministros dos negócios estrangeiros que o assinaram: Molotov pela União Soviética, e Ribbentrop pela Alemanha. Esse tratado previa que nenhum deles se aliaria a um inimigo do outro e, mais importante, previa a divisão da Polónia entre os dois e que a Finlândia, a Estónia, a Letónia e a Lituânia, e ainda partes da Roménia pertenceriam à União Soviética. A este pacto seguiu-se o Acordo Comercial Germano-Soviético em fevereiro de 1940.

Assim, a 1 de setembro de 1939 a Alemanha nazi invadiu a Polónia, tendo a União Soviética invadido a mesma Polónia logo a 17 de setembro. A 22 de setembro os exércitos soviético e alemão celebraram a conquista da Polónia com uma parada militar conjunta em Brest-Litovsk, uma cidade pequena localizada na linha de divisão da Polónia prevista no Tratado Molotov-Ribbentrop. O remanescente da resistência polaca terminou rapidamente e em outubro a Polónia deixou de existir, sendo dividida entre os dois invasores, ficando cada um deles com cerca de metade do país.

A União Soviética invadiu depois os outros países que o tratado previa, e incorporou-os na União Soviética, exceto a Finlândia, que se defendeu intensamente e cuja anexação pela União Soviética foi apenas parcial.

A aliança entre a Alemanha e a União Soviética quebrou quando, a 22 de junho de 1941, a Alemanha se virou contra o seu aliado e invadiu a União Soviética. É aliás só nesta data que a Rússia considera que a segunda guerra mundial começou, e não em 1939. Percebe-se porquê, pois de 1939 a 1941 a União Soviética esteve do lado da Alemanha nazi.

É também interessante que a invasão imperial da Polónia pela União Soviética foi justificada por Estaline pela preocupação com a situação na Polónia das minorias ucraniana e bielorrussas, pois a Ucrânia e a Bielorrússia integravam na altura a União Soviética. É a mesma cartilha que agora Putin usou para invadir a Ucrânia, invocando uma pretensa perseguição aos falantes de russo. Pode-se também ver que as atuais ambições imperiais russas mais não são que a continuação das ambições de Estaline, e dos que o precederam.

A data de 9 de maio assinala, sem dúvida, o fim da segunda guerra mundial na Europa, mas a Rússia esquece-se sempre de lembrar que essa guerra foi começada também por si e pela sua ambição imperial. 

 
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