Antropologia Médica

Ano
1
Ano lectivo
2023-2024
Código
02019633
Área Científica
Antropologia
Língua de Ensino
Português
Modo de Ensino
Presencial
Duração
Semestral
Créditos ECTS
10.0
Tipo
Obrigatória
Nível
2º Ciclo - Mestrado

Conhecimentos de Base Recomendados

Conhecimentos básicos sobre imigração e fluxos migratórios. Conhecimentos básicos sobre os contributos da sociologia e da antropologia para a compreensão do fenómeno migratório nas sociedades contemporâneas.

Conhecimentos básicos sobre estudos sociais das ciências e da medicina.

Conhecimentos básicos sobre os contributos da antropologia médica crítica, em relação à teoria e prática psiquiátricas.

Informações básicas sobre a “era colonial” da psiquiatria cultural.

Métodos de Ensino

Os métodos de ensino incluem exposição teórica sobre os conteúdos temáticos, com incentivo à participação e discussão dos alunos. Serão utilizados slides, vídeos e/ou outro material pedagógico considerado apropriado aos objetivos da Unidade Curricular.

Resultados de Aprendizagem

Valorização dos elementos biográficos e das histórias de vida na análise do processo migratório. Reconhecimento da importância dos aspetos históricos, sociais e culturais no contexto clínico, associados ao processo migratório.

Apreender a importância dos estudos sociais da ciência e da biomedicina. Reconhecer as limitações e aspirações da biomedicina enquanto teoria explicativa.

Explorar criticamente a teoria diagnóstica em psiquiatria, numa perspetiva antropológica.

Apreender os elementos coloniais da psiquiatria cultural, numa perspetiva histórica e antropológica.

Refletir sobre os contributos para uma antropologia da bioética.

Estágio(s)

Não

Programa

Bioética e relativismo cultural (Professor António Barbosa)

 

1. Práticas sanitárias e relativismo cultural

 

2. Duplo padrão em investigação biomédica

 

Cultura e diagnóstico psiquiátrico (Professora Chiara Pussetti)

 

Pesquisa biográfica, migrações e saúde: Implicações teóricas e práticas (Professora Elsa Lechner)

No encontro terapêutico entre imigrantes e prestadores de cuidados domésticos as questões clínicas são atravessadas por decisivos factores de ordem social, histórica e cultural, como por exemplo a situação de vulnerabilidade dos migrantes perante o Estado (serem ou não documentado/as); a herança de um passado colonial comum em lugares assimétricos (colonizadores e colonizados); as referências simbólicas e linguísticas de quem padece e de quem cuida (língua, linguagens, cultura, culturas terapêuticas, tradições médicas, cosmovisões).

Mesmo antes de chegar aos espaços institucionais de diagnóstico e de cura (hospitais, consultas, medicamentos), o sofrimento dos migrantes apresenta-se como um ―terreno‖ que permite conhecer os contextos onde os sintomas de mal-estar surgem, se intensificam ou acalmam, encontram fim ou perduram. Para conhecer tais contextos é necessário um contacto directo com o/as migrantes que vise as histórias de vida e percursos biográficos do/as mesmo/as.

Este módulo oferece uma análise teórica e prática do contributo da Pesquisa Biográfica para o estudo das migrações e saúde. Faremos uma revisão do estado da arte da Pesquisa Biográfica no seu crescente contexto interdisciplinar; análises aprofundadas de casos concretos a partir dos nossos terrenos de investigação; e uma reflexão sobre a teoria desta prática no âmbito específico da saúde mental.

O módulo pode ser acrescentado de uma oficina experimental para que os interessados façam a experiencia dos efeitos formadores, transformadores e cívicos do trabalho com e sobre histórias de vida.

 

Psicopatologia e Sociedade: Aproximações Etnográficas (Professor João Vasconcelos)

Esta unidade curricular pretende explorar as inter-relações entre psicopatologia e sociedade e estimular a reflexão acerca da universalidade da nosologia psiquiátrica. Serão as categorias nosológicas da tradição psiquiátrica directamente traduzíveis para outras tradições culturais? Será analiticamente adequada uma tradução directa de ―depressão‖, ―histeria‖ e ―esquizofrenia‖ por ―perda de alma‖, ―possessão espiritual‖ e ―êxtase místico‖? Diferentes linguagens limitar-se-ão a rotular diferentemente as mesmas patogenias? Ou estarão as linguagens implicadas nas próprias patogenias? E caso assim seja, a que níveis? Ao nível da simples compreensão de estados emocionais e psicossomáticos diferentes dos habituais? Ao nível da vivência subjectiva desses estados e das respostas sociais aos mesmos? Ou a níveis mais radicalmente etiológicos, constitutivos das próprias patogenias? Estas questões serão abordadas com base na leitura e na discussão de quatro monografias antropológicas que as exploram com detalhe etnográfico em contextos socioculturais bem diversos entre si.

 

Antropologia da Biomedicina (Professor Luís Quintais)

A cadeira de antropologia da biomedicina pretende explorar com os alunos um conjunto de tópicos que se prendem com uma das áreas de vanguarda do conhecimento antropológico. Fundamentalmente, trata-se de uma área de investigação que elege como espaço de interrogação na medicina ―ocidental‖ – a biomedicina, justamente -, ou seja, a teoria e a prática médicas das sociedades euro-americanas, teoria e prática que se encontram largamente disseminadas pelo mundo.

Um dos traços da biomedicina é a sua pretensão à sistematicidade. Os seus praticantes acreditam que o seu campo de acção detém uma autonomia. Por outras palavras, o seu exercício funda-se na ideia de que se trata de um campo de acção discreto, sem valências socio-culturais apreciáveis. Esta pretensão à sistematicidade e à neutralidade merece correcção. Ao assumirmos a relevância que os aspectos socio-culturais têm na teoria e prática biomédicas, estamos a assumir implícita e explicitamente que a biomedicina é um artefacto. O seu carácter artefactual faz supor que a biomedicina se funda numa matriz moral, simbólica, e social que importa deslindar. A biomedicina é, neste sentido, uma etnomedicina ou, de outro modo, um estilo de pensamento e acção socio-culturalmente moldado. É importante ainda, e neste sentido, tomar em linha de conta as extensões e recursividades que esta dimensão artefactual sugere.

Métodos de Avaliação

Contínua
Trabalho de síntese: 100.0%

Bibliografia

Elsa Lechner (Org.) (2009). Histórias de Vida: Olhares Interdisciplinares. Edições Afrontamento.

Lewis, Ioan M. 2003. Ecstatic Religion: A Study of Shamanism and Spirit Possession [3rd edition]. Londres e Nova Iorque: Routledge.
Littlewood, Roland. 1993. Pathology and Identity: The Work of Mother Earth in Trinidad. Cambridge: Cambridge University Press.
Littlewood, Roland. 2002. Pathologies of the West: An Anthropology of Mental Illness in Europe and America. Ithaca (NY): Cornell University Press.
Scheper-Hughes, Nancy. 2001. Saints, Scholars, and Schizophrenics: Mental Illness in Rural Ireland [20th anniversary edition, updated and expanded]. Berkeley: University of California Press.

DUMIT, Joseph, 2004, Picturing Personhood: brain scans and biomedical identity, Princeton, Princeton University Press.
FLECK, Ludwik, 1991 (1979), Genesis and Development of a Scientific Fact, Chicago & Londres, The University of Chicago Press, pp.20-51.
FOUCAULT, Michel, 1994 (1976), A Vontade de Saber História da Sexualidade I, Lisboa, Relógio d’ Água, pp. 135-61.
FRANKLIN, Sarah, 1995, ―Science as Culture, Cultures of Science‖, Annual Review of Anthropology, 24, pp.163-84.
GONZALEZ, Roberto J., Laura Nader, e C. Jay Ou, 1995, ―Between Two Poles: Bronislaw Malinowski, Ludwik Fleck, and the Anthropology of Science‖, Current Anthropology, 36, 5, pp.866-869.
GOOD, Byron J., 1995 (1994), Medicine, Rationality, and Experience: an anthropological perspective, Cambridge, Cambridge University Press, pp.1-24 e pp.65-87.
HAHN, Robert A., 1983, ―Biomedical Practice and Anthropological Theory: frameworks and directions‖, Annual Review of Anthropology, 12, pp.305-333.
HARAWAY, Donna J., 1991, Simians, Cyborgs, and Women: the reinvention of nature, Londres, Free Association Books Ltd, pp.149-181.
KLEINMAN, Arthur, 1995, ―What is specific to biomedicine‖, in Writing at the Margin: discourse between anthropology and medicine, Berkeley, LA, e Londres: University of California Press, pp. 21-40.
LAMBERT, Helen, 1996, ―Medical Anthropology‖, in BARNARD, Allan & Jonathan SPENCER (ed.), Encyclopedia of Social and Cultural Anthropology, Londres e Nova Iorque, Routledge, pp.358-361.
LATOUR, Bruno, 1986 (1979), Laboratory Life: the construction of scientific facts, Princeton, New Jersey, Princeton University Press, pp. 15- 90.
MOL, Annemarie, 2002, The body Multiple: ontology in medical practice, Durham & Londres: Duke University Press.
RABINOW, Paul, 1996a, ―Artificiality and Enlightenment: from sociobiology to biosociality‖, in Essays on the Anthropology of Reason, Princeton, Princeton University Press, pp.91-111.